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Pansophia

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sábado, 3 de março de 2012

Martinho de Dume - (518-579)

por Osvaldo Duarte

Natural da Panónia (Hungria), São Martinho de Dume, também conhecido como São Martinho de Braga, nasceu entre 518-525. Foi nomeado bispo de Dume e, posteriormente, arcebispo de Braga, falecendo em 20 de março de 579.
Martinho, que é considerado Apóstolo dos Suevos, tinha como missão evangelizar a Galécia, região conquistada pelo povo germânico (Suevos), os arianos. Sua missão foi bem sucedida, pois, dada a afirmação da fé cristã esta região não mais caiu em heresia.
Possuidor de vasta cultura e conhecedor da Patrística, sua formação ainda é uma questão non liquet; segundo alguns autores, sua formação cultural se desenvolveu na Itália, possivelmente em Roma; segundo outros, ocorreu no Oriente; mas não sabemos ainda com certeza, onde o bispo aprendeu grego.
 A tradição atrelou o nome de Sêneca às principais obras de Martinho, sendo que até o séc. XVI algumas obras de Martinho gozaram na Europa medieval como sendo obras de Lúcio Sêneca, como por exemplo: De Ira, o que nos leva a outra questão interessante proposta por A. Miranda Barbosa: A influência de Sêneca na Idade Média; infelizmente, ainda inconclusiva e pouco estudada. Quanto à influência do bispo de Hipona, Martinho trabalha o texto agostiniano com liberdade ao escrever De Correctione Rusticorum (Contra as Superstições: Da instrução dos Rústicos), do qual seguem excertos, mais adiante.
Sua obra, ao que tudo indica, não é trabalho original, mas ordenação de textos alheios, o que é natural neste período de decadência cultural, cuja preocupação dos raros eruditos era salvaguardar os tesouros da Sabedoria antiga.
A. Miranda, nos chama a atenção para a questão da autoria dos textos, e que poderia ter saído da pena de algum filósofo pagão. Na Fórmula, no De Moribus e no De Ira, não há sequer uma citação Bíblica e, muito menos, de algum Padre.

Apresentamos abaixo, excertos do opúsculo De Correctione Rusticorum, que provavelmente foi redigido por volta do ano 572, após a realização do II Concílio de Braga, em 1 de junho daquele ano. Esse texto é um trabalho de fixação de crença, no caso, a fé cristã; e foi dirigido ao povo rústico, os aldeões da zona da Galécia, tendo como destinatário o bispo Polémio de Astorga. Essa afirmação da fé cristã pretende levar os aldeões a abandonarem seus ritos sagrados, substituindo-os pelo batismo, abandonando as heresias e aceitando a verdade cristã sob a ameaça de sofrer o castigo eterno.
Do bispo Santo Martinho para o bispo Polémio.
(...) Vendo o Diabo que o homem fora criado, precisamente, para ocupar no reino de Deus, o lugar de onde ele tinha caído, roído de inveja, persuadiu o homem a transgredir os mandamentos de Deus. Devido a esta ofensa, o homem foi expulso do Paraíso, para exílio deste mundo, onde sofreria muitos trabalhos e dores.
(...) Então, o Diabo e os seus ministros, os demónios, que foram expulsos do Céu, vendo os homens ignorantes, esquecido de Deus seu Criador, começavam a entre as criaturas e aparecer-lhes, manifestando-se-lhes de diferentes formas, a falar com elas e a pedir que lhes oferecessem sacrifícios no alto dos montes, nas florestas frondosas e a considera-los como deuses, dando a si próprios nomes de homens celerados, que tinham passado a vida a cometer celeridades de toda a espécie de crimes, um chamou a si de Júpiter, o qual fora mago e se manchara e adultérios e incestos, de tal modo que tomou por sua mulher a irmã, que se chamava Juno, corrompeu as suas filhas Minerva e Vênus e cometeu incesto, torpemente, com todos os seus parentes.
Um outro demónio quis chamar-se Mercúrio, que foi inventor dos roubos e das fraudes dolosas, q quem os homens cobiçosos, como se fosse ao deus do lucro, oferecem sacrifícios, ao passarem pelas encruzilhadas, lançando pedras e com elas formando montes.
Outro demónio atribuiu a si próprio o nome de Saturno, que vivendo em total crueldade, até devorava os seus filhos recém-nascidos.
Outro demónio fingiu que era Vênus, que foi mulher meretriz. Não só cometeu inumeráveis adultérios, como se prostitui com o seu pai Júpiter e com seu irmão Marte.
(...) Os demónios também persuadiram a que lhes construíssem templos e que neles colocasse imagens ou estátuas de homens celerados e lhes erguessem altares nos quais sacrificassem sangue, não só de animais, mas também de homens.
Além disso, muitos demónios, que foram expulsos do Céu, presidem o mar, aos rios, às fontes, às florestas, aos quais os homens ignorantes de Deus, do mesmo modo adoram como se fossem deuses e oferecem-lhes sacrifícios. No mar são chamados Neptuno, nos rios Lâmias, nas fontes Ninfas, nas florestas Dianas; todos eles são demónios e espíritos malignos que atormentam e perturbam os homens infiéis, que não sabem proteger-se com o sinal da cruz.
Contudo, não os atormentam sem a permissão de Deus, porque têm irritado Deus e não crêem, com todo o coração, na fé de Cristo, mas são dúbios. “A ponto de darem os nomes próprios dos demónios a cada um dos dias e chamam-lhes dia de Marte, de Mercúrio, de Júpiter, de Vénus e de Saturno, eles que não fizeram nenhum dia, mas foram homens péssimos e celerados entre gente grega.”
Preparai a vossa vida com boas obras. Frequentai a Igreja ou os lugares sagrados para rezar a Deus. Não desprezai o dia do Senhor, mais respeitai-o com reverência, o qual se chama Domingo, porque o Filho de Deus, Nosso Senhor Jesus Cristo, nesse dia ressuscitou dos mortos.
Como é iníquo e vergonhoso que aqueles que são pagãos e que ignoram a fé Cristã, adorando os ídolos dos demónios, guardem o dia de Júpiter ou de qualquer outro demónio e se abstenham de trabalhar, quando na realidade os demónios não criaram e nem possuem nenhum dia.

Uma pitada de ceticismo?
Regra de vida Honesta
“É próprio do prudente, escreve S. Martinho de Dume, examinar conselhos e não se deixar levar arrebatadamente dos falsos com fácil credulidade. Nas coisas duvidosas não decididas, mas suspende o teu juízo: nada afirmes sem o teres averiguado, porque nem tudo o que tem aparência de verdade é verdadeiro; assim como, muitas vezes, o que à primeira vista parece incrível nem por isso é falso. De facto, frequentemente a verdade conserva a cara da mentira e não poucas a mentira se esconde debaixo da aparência da verdade”.
Créditos
MARTINHO DE DUME. Opúsculos Morais. Tradução: Maria de Lourdes Sirgado Ganho. Lisboa, INCM, 1998.
BARBOSA, A. Miranda. Obras Filosóficas. Lisboa, INCM, 1996.
MARTINS, Mário. Correntes da Filosofia Religiosa dos séc. IV a VII. Porto, Livraria T Martins, 1950.

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